Don Julio

Escrito por Lucas Ferraz - DE BUENOS AIRES

Um dos personagens mais pitorescos da Argentina é Julio Humberto Grondona, presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino), a entidade máxima do futebol, e, sem exagero nenhum, um dos homens mais poderosos do país.Prestes a completar 80 anos (no próximo domingo, dia 18), don Julio, como é conhecido, está há 32 anos no cargo. No mês que vem, quando haverá eleição na entidade, ele ganhará direito, com louvação, a dirigir a AFA por mais quatro anos. Será a oitava reeleição do argentino, talvez um dos maiores recordes da cartolagem mundial _nosso Ricardo Teixeira, bem posicionado no ranking (seria ele um Grondona brasileiro ou o Julio que é um Teixeira argentino?), chefia a CBF há 22 anos."Até agora não há candidato, e é provável que não haja. É assim mesmo, sempre há aclamação", diz candidamente Darío Villaruel, um dos assessores de Grondona na associação.
Desde 1979, quando foi eleito com o apoio dos militares, durante a última ditadura (76-83), Grondona só teve um opositor nas oito eleições em que participou na AFA. Foi em 1995, quando o ex-árbitro Teodoro Nitti o enfrentou na disputa pela presidência _mas Nitti só recebeu um voto, o próprio.Os inimigos _atualmente o ex-aliado Maradona é um deles_ não conseguem enfrentá-lo. "É praticamente impossível romper a barreira, ele compra tudo e a todos. É mafioso, perverso e doente por poder e dinheiro", disse em entrevista à Folha Raúl Gamez, ex-presidente do Vélez Sarsfield. Cartola do clube portenho por 18 anos, Gamez tentou, sem sucesso, furar o cerco. "Pode escrever aí: Grondona é um gângster", completou.
Apesar de usar há décadas um anel com a inscrição "tudo passa" _no seu escritório há um enfeite com a mesma frase_, Julio Grondona, segundo diz o assessor Darío Villaruel, continua na AFA porque ninguém se apresenta para substituí-lo. "Não há candidato", comenta. Infelizmente Grondona não quis dar entrevista.Alvo de dezenas de ações judiciais na Argentina (por corrupção, administração fraudulenta e evasão de divisas, todas arquivadas por falta de provas), o cartola foi acusado de participar do recente escândalo da Fifa (entidade na qual é um dos vice-presidentes) que, segundo reportagem da BBC, rendeu propina para ele e para Ricardo Teixeira, entre outros dirigentes, em troca de votos nas decisões da entidade. Ambos negam qualquer benefício.
Com a complacência de todos os clubes argentinos, Grondona ficou ainda mais forte após a aliança com o governo argentino, em 2009. Ele se aliou aos Kirchner e do casamento surgiu a estatização do futebol _todo o campeonato nacional é exibido na TV pública, ao lado de muita propaganda governamental. (Aliás, essa é uma das muitas alianças espúrias de um governo que diz sem modéstia revolucionar a esquerda mundial, assunto que fica para outro post)
Na semana que passou, Grondona disse a uma rádio de Buenos Aires que ficou muito feliz ao ser chamado de "Néstor Kirchner da Fifa" _assim um amigo se referiu a ele. Don Julio admira tanto o ex-presidente, o falecido marido de Cristina, que até batizou o campeonato argentino com o seu nome.

Comentários