IDH: não é só desgraça

Escrito por Fábio Zanini

À primeira vista, nada a comemorar para a África no novo Relatório de Desenvolvimento Humano, divulgado na ultima segunda pela ONU. É o índice mais aceito mundialmente para medir o nível de bem-estar de um país.
Por meio de uma complexa fórmula que pesa diferentes indicadores, como acesso a educação, distribuição de renda e crescimento econômico, chega-se a um índice numérico variando de 0 (pobreza absoluta) a 1 (bem-estar absoluto). Há um intervalo de dois anos entre a aferição dos dados e sua divulgação, então os números de hoje refletem a realidade de 2007.
Todos os anos os africanos ocupam com destaque a parte de baixo da tabela, e hoje não foi diferente. Dos 20 países com menor índice entre os 182 pesquisados, 19 são africanos (o infiltrado é o Afeganistão). O mais pobre do mundo continua sendo o Níger, nação desértica no oeste do continente que enfrenta crises cíclicas de fome. Obteve nota 0,340 na escala. A primeira colocada é a Noruega, com índice 0,971. O Brasil ocupou a 75ª posição, com índice 0,813.
O Níger é seguido na escala de pobreza pelos afegãos e depois Serra Leoa, República Centro-Africana, Mali, Burkina Fasso, República Democrática do Congo (RDC), Chade, Burundi, Guiné-Bissau, Moçambique e mais uma penca de africanos.
Das 53 nações africanas, apenas 3 têm índice de desenvolvimento considerado alto (acima de 0,800): a Líbia, que nada em petróleo, e dois países insulares, que vivem do turismo: Ilhas Seychelles e Ilhas Maurício, no Oceano Índico.
Têm índice médio 26 países, enquanto 22 ficaram na mais absoluta pobreza. Por falta de condições de segurança para coleta dos dados, faltaram dois para serem avaliados: Zimbábue (que deve entrar no ano que vem, já que a situação melhorou um pouco no país) e a Somália (essa é um caso perdido, pelo futuro próximo).
Notícias deprimentes para o continente, sem dúvida. Mas é só desgraça mesmo? Não. Olhe por outros ângulos, e é possível enxergar um lado positivo.
Primeiro porque praticamente todos os países melhoraram suas notas no relatório desse ano com relação ao do ano passado (que reflete a realidade de 2006). Mesmo o coitado do Níger subiu de 0,335 para 0,340. As duas exceções foram Congo-Brazzaville e Chade. Por enquanto, não consigo achar uma explicação.
Essa boa notícia tem de ser relativizada pelo fato de que praticamente todos os países do mundo melhoraram suas notas (pelo menos a África manteve o padrão). Mas há algo muito mais interessante que ocorrer nos últimos 12 meses.
Comparei os índices desse ano e os do ano passado e fiz uma tabela de quem melhorou mais, percentualmente. Ou seja, quem fez mais progresso. Veja o resultado:

1-) República Democrática do Congo
de: 0,371 para 0,389
variação: 4,85%

2-) Etiópia
De: 0,402 para 0,414
Variação: 2,99%

3-) Serra Leoa
De: 0,357 para 0,365
Variação: 2,24%

4-) Angola
De: 0,552 para 0,564
Variação: 2,17%

5-) Tanzânia
De: 0,519 para 0,530
Variação: 2,12%

Os primeiros não africanos entre os que mais se desenvolveram só aparecem na oitava posição (Azerbaijão e Butão), ainda assim empatados com o africano Burundi. Dos 20 que mais cresceram no ranking, 14 são africanos. Ou seja, o ranking relativo é praticamente a imagem refletida no espelho do ranking em números absolutos.
Como explicar o fenômeno? Países em situação de terra arrasada em geral só têm como melhorar. Quem parte de uma situação pior tende mesmo a crescer mais.
Mas é preciso entender também que presidentes africanos têm uma incrível capacidade de continuar cavando, mesmo no fundo do poço. E isso agora não aconteceu. Uma onda ainda tímida de democracia, respeito a regras e liberação comercial no continente parece ter surtido algum efeito. Falarei mais sobre isso num próximo texto.

Fonte:penaafrica.folha.blog.uol.com.br

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