Navegar é preciso, viver não é preciso

No mundo das letras, sabemos que o processo criativo nem sempre se encerra na mente geniosa de um escritor capaz de gerar um mundo completamente isento da realidade que o cerca. Cada vez mais, estudiosos vem detectando que vários romances, contos, poemas e canções se mostram ricamente contaminados pelos valores de seu tempo. Em alguns casos, ainda é possível ver que o processo criativo também abraça referências históricas bastante remotas em relação ao tempo em que vive o autor.
Ao falarmos que “navegar é preciso, viver não é preciso”, alguns logo citam a genialidade do escritor português, Fernando Pessoa. Indo um pouco mais adiante sobre o estudo dessa frase, aponta este que, o poeta ao mesmo tempo em que lançava uma sentença sobre a condição do homem, dialogava ricamente com a tradição histórica dos portugueses na exploração dos mares.
Contudo, devemos saber que essa interpretação está longe de remontar as origens da afamada frase.
No século I a.C., os romanos viviam ativamente o seu processo de expansão econômica e territorial. Na medida em que Roma se transformava em um império de dimensões gigantescas,a necessidade de desbravar os mares, se colocava como elemento fundamental para o fortalecimento de uma das mais importantes potências de toda a Antiguidade. Foi nesse contexto que o general Pompeu, por volta de 70 a.C., foi incumbido da missão de transportar o trigo das províncias para a cidade de Roma.Naqueles tempos, os riscos de navegação eram grandes, em virtude das limitações tecnológicas e dos vários ataques piratas que aconteciam com relativa frequência. Sendo assim, os tripulantes daquela viagem viviam um grave dilema: salvar a cidade de Roma da grave crise de abastecimento causada por uma rebelião de escravos, ou fugir dos riscos da viagem mantendo-se confortáveis na cidade de Sicília. Foi então que, de acordo com o historiador Plutarco, o general Pompeu proferiu essa lendária frase.
De fato, a afirmação do general Pompeu surtiu bons frutos. A viagem foi realizada com sucesso e o militar ascendeu ao posto de cônsul com amplo apoio das camadas populares romanas. Pouco tempo depois, esse mesmo prestígio o fez ser um dos integrantes do Primeiro Triunvirato que governou todo o território romano. Afinal, será que foi a vitória da história de Pompeu que levou o lendário escritor português a tomar empréstimo dessa instigante sentença? Quem sabe!

Por Rainer Sousa - Graduado em História - Equipe Brasil Escola

Comentários

  1. Interpretei essa frase de uma forma um pouco diferente: tudo que nós escrevemos pode transceder mais tempo até mesmo do que as nossas vidas.

    Outro dia, peguei um antigo texto meu que escrevi em 2001, quando era adolescente. Lá, a principio, fala de um garoto de 16 que não tem juízo nenhum. Não coloquei nenhuma referência histórica. Mas, quando fui ler esses dias, percebi que ele já carrega as marcas do seu tempo: nenhum dos personagens tem celular, que dirá computador. Além disso, a descrição das roupas, das gírias, tudo já mudou em tão pouco tempo...rsrs Isso me fez pensar como mesmo sem perceber, já escrevemos coisas totalmente dentro de um contexto histórico...rs

    Otimo post!

    Abçs!!

    Danilo Moreira

    Quando puder, visite:
    http://blogpontotres.blogspot.com/
    Ponto Retrô - Programa Livre - SBT

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